Aplicações industriais das microalgas
- Priscila Costa Carvalho de Jesus
- Mar 21, 2021
- 4 min read
Updated: Mar 23, 2021
O interesse nesta classe de microrganismos provém do seu potencial uso para produzir biocombustíveis e produtos de alto valor, fazendo a fixação de carbono utilizando luz solar

Este artigo é um breve relato de algumas das aplicações industriais das microalgas, porém esse campo de pesquisa é muito vasto e está em constante crescimento.
Breve histórico e desenvolvimento recente
Os primeiros estudos com microalgas provavelmente datam do estabelecimento de uma cultura de Chlorella sp., por Beijerinck em 1890.
As primeiras tentativas de se desenvolver produtos comerciais a partir de microalgas foram reportadas na década de 40 (HARDER; VON WITSCH, 1942) e consistiram de lipídeos, posteriormente na década de 60 de carotenoides (KATHREIN, 1964), e proteínas na década de 70 (SOEDER; PABST, 1970, VENKATARAMAN; BECKER; SHAMALA, 1977). As primeiras microalgas comercializadas foram Chlorella spp. e Spirulina spp. como “comida saudável” no Japão (no final da década de 50), Taiwan e México (ambos na década de 80) (BOROWITZKA, 2013).
Aspectos de interesse: ambiental, biotecnológico e econômico
O artigo de CHISTI (2007) representou um marco nas pesquisas com microalgas e cultivos em larga escala. O autor afirmou que “o biodiesel microalgal é o único biodiesel renovável com o potencial de substituir completamente os combustíveis líquidos derivados do petróleo para transporte”. Apesar de ser ambientalmente favorável, considerando que o biodiesel é um combustível obtido por fontes renováveis, a produção de biodiesel por microalgas é atualmente somente economicamente viável quando associada à co-produção de produtos de alto valor utilizando outros constituintes da biomassa microalgal.
Produtos de alto valor produzidos por microalgas
Microalgas têm sido utilizadas para transformar CO2 em uma grande variedade de metabólitos industrialmente interessantes.
São eles: carotenoides, vitaminas, ficobilinas, ácidos graxos, esteróis, poli-hidroxialcanoatos, polissacarídeos e outros compostos biologicamente ativos para aplicações farmacêuticas e nutracêuticas (BOROWITZKA, 2013).
Dentre os carotenoides, β-caroteno foi primeiramente produzido por Dunaliella salina, já que esta cresce em altas concentrações salinas, reduzindo o risco de contaminação, além de possuir o maior teor de β-caroteno do que qualquer outro organismo. Outro tipo de carotenoide, produzido pela alga verde Haematococcus pluvialis proveniente de água doce, é a astaxantina, principalmente para o uso como aditivo alimentar para pigmentação da carne nos cultivos de salmão e truta. Ficobilinas são pigmentos naturais hidrossolúveis somente produzidos por algas e incluem ficocianina, ficoeritrina e aloficocianina. Estes pigmentos podem ser utilizados na indústria alimentícia, cosmética, como marcadores fluorescentes em citometria de fluxo e imunologia, além de outros usos terapêuticos como compostos fotossensíveis em terapia fotodinâmica para tratamento de câncer (BOROWITZKA, 2013).
Os lipídeos de microalgas constituem uma fonte rica em ácidos graxos, tais como ácido linoleico, ácido araquidônico, ácido eicosapentanóico (EPA) e ácido docosahexanóico (DHA). Estes possuem importantes aplicações biotecnológicas, especialmente na alimentação de animais, considerando que o óleo de algas é comparável com o proveniente de peixes. Ainda, microalgas produzem uma variedade de fitoesteróis, dependendo da espécie e condições de crescimento, os quais apresentam aplicações tanto na indústria farmacêutica quanto na alimentícia. Cianobactérias, tais como Spirulina sp. e Synechocystis sp., também têm sido avaliadas para produzir poli-3-hidroxibutirato (P3HB), polímero biodegradável, sob condições de crescimento mixotróficas, apesar de que em quantidades menores do que já reportado para bactérias (BOROWITZKA, 2013). Todas essas potenciais aplicações biotecnológicas demonstram um cenário favorável para produzir produtos de alto valor a partir de microalgas, ainda não completamente explorado.
Biocombustíveis produzidos por microalgas
Além de biodiesel, os componentes não lipídicos são matéria-prima para produção de etanol e biogás por fermentação.
A biomassa de microalgas após extração dos lipídeos (para produção de biodiesel) ainda é rica em carboidratos e proteínas, que podem servir como matéria-prima para cultivos de microrganismos e produção de outros biocombustíveis. Os carboidratos de microalgas apresentam vantagens frente a matérias-primas lignocelulósicas, pois não estão associados à lignina, estando prontamente disponíveis para produção de etanol ou butanol (GAO; ORR; REHMANN, 2016). Outra abordagem para produção de combustíveis renováveis é a produção de biogás (O2, N2, CH4, H2 e CO2) com alto teor de metano, através da digestão anaeróbica da torta contendo carboidratos e proteínas, ou co-digestão com outras matérias-primas, como resíduos de alimentos. De fato, a mono-digestão é difícil devido à liberação de quantidades substanciais de amônia, formada através do nitrogênio das proteínas, o que basifica o pH e prejudica a ação das bactérias acidogênicas e metanogênicas. Dessa forma, microalgas cuja composição química apresente a razão carbono/nitrogênio (C/N) entre 20 e 30 possuem maior potencial metanogênico (HERRMANN et al., 2016). Biohidrogênio também pode ser produzido por fermentação dos carboidratos de microalgas em condições anaeróbicas pelas enzimas hidrogenases (KUMAR et al., 2016).
Microalgas na separação e melhoramento de gás natural e biogás
Capacidade de consumir seletivamente CO2.
A concentração de CO2 no gás natural, o qual é majoritariamente composto por metano, é em torno de 8% (BALCOMBE et al., 2015), enquanto no biogás este valor é em torno de 30 a 40% (MEIER et al., 2015). No entanto, para ser considerado um combustível potencial, o gás deve conter no mínimo 90% de metano, o que requer métodos de separação de CO2. Métodos convencionais consistem em absorção, adsorção, filtração por membranas, separação criogênica, entre outros (KURAMOCHI et al., 2012; MEIER et al., 2015).
Microalgas têm sido estudadas para esta finalidade. Para separação de gases, é importante estudar a toxicidade dos gases e o quanto microalgas são suscetíveis a crescerem em atmosfera rica em metano. Estudos focados nesta abordagem não reportaram nenhum sinal de toxicidade ou inibição por esse gás, embora a taxa de crescimento das microalgas tenha sido reduzida (MEIER et al., 2015). Outros gases nocivos que podem eventualmente estar presentes, dependendo da composição, são SOx e NOx, os quais normalmente inibem o crescimento das microalgas (NEGORO et al., 1991), porém podem ser removidos com equipamentos adequados (WILSON et al., 2016).
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